domingo, 21 de novembro de 2010

Por falar em plenitude

Cassiano Leonel Drum]


Liberato Vieira da Cunha
Por falar em plenitude

Esqueci uma palavra. O outro dia me perguntaram numa entrevista quais os vocábulos da língua portuguesa de que mais gostava e servi ao interrogante uma longa lista, pois meu ofício é navegar nas correntezas do idioma. E eis senão que agora, de repente, descubro que me perdi de uma essencial.

É a palavra plenitude.

Concedo que não é muito usada. Desconfio também que muitos não saibam o que quer dizer. Eu poderia neste instante ir ao dicionário mais próximo e transmitir sua clássica definição. Suspeito porém que não pode ser descrita. Pois plenitude escapa a qualquer conceituação. Plenitude é um sentimento.

Percebo a visita da plenitude quando a bordo de uma sinfonia de Beethoven, de um concerto de Bach, de uma ária de Mozart. Deixo de ser eu próprio para embarcar em tons e acordes que me conduzem a labirintos de mim mesmo que nem eu conhecia.

Me vejo imerso em plenitude quando um livro me absorve de tal forma que não sou eu que o leio, é ele que me lê e desvenda quartos fechados de minha alma. A vida deixa de ser realidade para transformar-se em aparência de concretude.

Me surpreendo acompanhado de plenitude quando mergulho na completude de uma tela e em seus mistérios disfarçados de lógica ou de claridade.

Já me exilei do mundo contemplando a vastidão do Pacífico e me identificando tão pequeno como numa jangada perdida, sem rumo nem norte.

Mas não conheço melhor tradução de plenitude do que esta que se reflete no fundo de teus olhos claros, como se não houvesse no universo maior beleza ou mais imenso enigma.

liberato.vieira@zerohora.com.br 

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